sábado, 12 de abril de 2008

3. As leis, a nobreza e o povo - Kafka e o Direito

3. As leis, a nobreza e o povo

Kafka no conto “Sobre a questão das leis” utiliza-se da palavra nobreza ao tratar do grupo que domina o povo e que faz as leis. Esse termo é interessante, pois não se trata apenas de um grupo detentor do poder econômico, mas sim de um grupo que alia o poder econômico com uma detenção de informações privilegiada e contato direto com os governantes e influência sobre estes. A nobreza não se submete as leis, pois está acima dela. Somente não estando sob a submissão das leis é que a nobreza pode dominar o povo.
A nobreza também nos faz lembrar um governo que não é instituído pela escolha do povo, mas sim através da hereditariedade. São nobres aqueles que nasceram como tal, ou que vieram adquirir o título através da prestação de algum serviço, à coroa. Esse caráter hereditário do exercício do poder, evidencia a dificuldade de um indivíduo que não seja desse grupo, vir a modificar as leis. E é mesmo difícil que a nobreza ao fazer suas leis, venha a ser influenciada por pretensões de indivíduos que não são do grupo.
Kafka expõe isso no seguinte trecho: “Além do mais é evidente que a nobreza não tem motivo algum, na interpretação, para se deixar influenciar pelo interesse pessoal em detrimento do nosso, pois as leis foram desde o início assentadas para os nobres, a nobreza está fora da lei e precisamente por isso parece ter sido posta com exclusividade nas mãos da nobreza”[1].
O povo é apresentado por Kafka como um objeto da dominação. Não há para ele escapatória e possibilidade de emancipação, frente ao poderio da nobreza que está acima das leis. As tentativas do povo em lidar com a lei se mostram frustradas. Porém não há ódio por parte do povo contra a nobreza, mas um sentimento de culpa do povo, “por não sermos dignos ainda de ter lei”[2].
No livro “O Processo” o personagem Joseph K. também sofre com os entremeios do poder judiciário, ao não poder saber nem ao menos da acusação que recebera. Joseph K. não consegue se esquivar do processo por nenhuma maneira. Não há saída a não ser se submeter a leis que não conhece. Joseph submete-se a todo o procedimento, em uma mistura de indignação velada e da impensável ou impossível revolta. A dominação é completa. Dominação que é feita através de meios externos (Direito, Dinheiro, Tempo) e meios internos (culpa). Não há ódio e revolta frente às leis, pois se entende que essas são necessárias.
Nesse romance kafkaniano há a presença constante da burocracia estatal, que na forma de seus guardas, juízes e outros funcionários; assegura para que a lei seja cumprida. Porém a essa burocracia não tem conhecimento de todo o procedimento de acusação de Joseph K. Sempre falta a alguém alguma informação, que parece só ser de acesso de alguém com “poderes superiores”. A burocracia assim como o povo é dominada, por não saber as leis, por somente ter acesso à parte da informação. Não sabendo o verdadeiro desígnio da lei, cumpre-se o que foi passado como ordem, sempre na esperança de estar fazendo o que é justo.
[1] KAFKA. Sobre a questão das leis.
[2] KAFKA, Fanz. Sobre a questão das leis. P,

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