quarta-feira, 4 de junho de 2014

Filosofia do Direito- Kelsen V



* Direito como criação humana
- Kelsen entende que o direito é criação humana, diferentemente  do que ocorre em muitos autores do jusnaturalismo, em que o direito é entendido como um achado da natureza, ou mesmo na natureza humana (na razão).
- Para Kelsen o direito é produzido pelo homem, que tem total responsabilidade pelo conteúdo desse direito. Com isso, Kelsen entende que o homem pode criar um direito democrático, nazista ou totalitarista e que isso não tem relação com a natureza.
_Com esse entendimento que o direito é criação humana, Kelsen não precisa de Deus para justificar  o Direito. Não é Deus que garante o direito, nem a justeza ou a bondade no direito, mas sim o próprio homem.  Em alguns ordenamentos jurídicos anteriores, como no caso dos direitos ligados à religião, Deus era garantidor do direito.
Texto: As normas de uma ordem jurídica têm de ser produzidas através de um ato especial de criação2. São normas postas, quer dizer, positivas, elementos de uma ordem positiva. Se por Constituição de uma comunidade se entende a norma ou as normas que determinam como, isto é, por que órgãos e através de que processos - através de uma criação consciente do Direito, especialmente o processo legislativo, ou através do costume - devem ser produzidas as normas gerais da ordem jurídica que constitui a comunidade, a norma fundamental é aquela norma que é pressuposta quando o costume, através do qual a Constituição surgiu, ou quando o ato constituinte (produtor da Constituição) posto conscientemente por determinados indivíduos são objetivamente interpretados como fatos produtores de normas; quando - no último caso - o indivíduo ou a assembléia de indivíduos que instituíram a Constituição sobre a qual a ordem jurídica assenta são considerados como autoridade legislativa. Neste sentido, a norma fundamental é a instauração do fato fundamental da criação jurídica e pode, nestes termos, ser designada como constituição no sentido lógico-jurídico, para a distinguir da Constituição em sentido jurídico-positivo. Ela é o ponto de partida de um processo: do processo da criação do Direito positivo”  (Kelsen, Teoria Pura do Direito. P, 139)

* Kelsen e o direito internacional  (item opcional, para algumas turmas que não deu tempo de dar esse item, por favor leiam)
- A teoria de Kelsen trata de uma teoria do direito que está ligada a um Estado, uma vez que é esse que coloca as normas de um ordenamento jurídico.
- Surge a dúvida de como ficaria o Direito internacional em Kelsen, uma vez que este seria uma outra ordem  jurídica que rivalizaria com a ordem estatal nacional.
-Há duas teorias para a adoção do direito internacional: a teoria monista, que entende que apenas um direito pode existir para não ocorrer conflito de normas e de poder; a teoria dualista que aceita a existência de dois tipos de direito o nacional e o internacional, estabelecendo normas para a compatibilidade, mas não deixando de aceitar a possibilidade de duas ordens diferentes de normas jurídicas.
-Kelsen defende a teoria monista do direito, ou seja, para ele somente pode existir uma ordem jurídica. Nesse caso, Kelsen irá entender que o direito internacional entra na ordem jurídica nacional, quando o conteúdo de suas normas passam a figurar como normas nacionais. Por exemplo, um tratado internacional assinado pelo Brasil no âmbito internacional entra na legislação nacional quando este tratado se transforma em lei por votação no Legislativo.
Texto: “As relações mútuas entre dois sistemas de normas.   A unidade entre Direito internacional e Direito estadual pode, no entanto, ser produzida de dois modos diferentes, do ponto de vista gnoseológico. E, quando consideramos ambos estes Direitos como ordenamentos de normas vinculantes simultaneamente válidas, não o poderemos fazer por qualquer outra forma que não seja abrangendo a ambos, por uma forma ou por outra, em um sistema descritível em proposições jurídicas não contraditórias.  Dois complexos de normas do tipo dinâmico, como o ordenamento jurídico internacional e um ordenamento jurídico estadual, podem formar um sistema unitário tal que um desses ordenamentos se apresente como subordinado ao outro, porque um contém uma norma que determina a produção das normas do outro e, por conseguinte, este encontra naquele o seu fundamento de validade. A norma fundamental do ordenamento superior é, neste caso, também o fundamento de validade do ordenamento inferior.  Dois complexos de normas também podem, porém, formar um sistema de normas unitário tal que os dois ordenamentos surjam como situados ao mesmo nível, quer dizer, delimitados, nos respectivos domínios de validade, um em face do outro. Isso pressupõe, porém, um terceiro ordenamento, de grau superior, que determine a criação dos outros dois, os delimite reciprocamente nas respectivas esferas de validade e, assim, os coordene.  A determinação do domínio de validade é - como resulta do anteriormente dito - a determinação de um elemento de conteúdo do ordenamento inferior pelo ordenamento superior. A determinação do processo de produção pode fazer-se direta ou indiretamente, conforme a norma superior determine o próprio processo no qual a inferior é produzida, ou se limite a instituir uma instância que, desta forma, é autorizada a produzir, como bem entenda, normas com validade para um determinado domínio. Em tal caso fala-se de delegação, e a unidade em que o ordenamento superior está ligado com o ordenamento inferior tem o caráter de uma conexão delegatória. Daí mesmo já ressalta que a relação do ordenamento superior com os vários ordenamentos inferiores em que aquele delega tem de ser, simultaneamente, a relação de um ordenamento total com os ordenamentos parciais por ele abrangidos. Com efeito, como a norma que é o fundamento de validade do ordenamento inferior forma parte integrante do ordenamento superior, pode aquele, enquanto ordenamento parcial, ser pensado como contido neste, enquanto ordenamento total. A norma fundamental do ordenamento superior - como escalão máximo do ordenamento global - representa o último fundamento de validade de todas as normas - mesmo das dos ordenamentos inferiores.  Se o Direito internacional e o Direito estadual formam um sistema unitário, então a relação entre eles tem de ajustar-se a uma das duas formas expostas. O Direito internacional tem de ser concebido, ou como uma ordem jurídica delegada pela ordem jurídica estadual e, por conseguinte, como incorporada nesta, ou como uma ordem jurídica total que delega nas ordens jurídicas estaduais, supra-ordenada a estas e abrangendo-as a todas como ordens jurídicas parciais. Ambas estas interpretações da relação que intercede entre o Direito internacional e o Direito estadual representam uma construção monista. A primeira significa o primado da ordem jurídica de cada Estado, a segunda traduz o primado da ordem jurídica internacional” (Kelsen, Teoria Pura do Direito, p, 233

* Estrutura da norma juridica  
- direito entendido como ordem coativa, que impõe uma sanção
- direito impõe condutas, essas condutas são de dever- ser
- Kelsen busca também explicar as normas jurídicas de forma lógica, sem entrar no mérito do conteúdo das normas. Assim, busca uma estrutura das normas jurídicas.
- Para Kelsen a norma jurídica sempre tem essa estrutura:
Dado um fato X deve-ser um ato de coação Y
ou seja, dado um comportamento que tenha imputação haverá uma sanção
- Para Kelsen a norma irá proibir ou permitir uma determinado comportamento

Texto: "Estrutura da norma jurídica. O direito se distingue de outras ordens sociais porque os atos de coação prescritos podem ser aplicados, se necessário, mediante o emprego de força física. A coação psiquica é comum a todas as ordens sociais e pode também derivar do direito, embora isso não seja essencial. As proposições jurídicas descrevem as normas por e nunciados deôntidos, isto é, afirmações de que alguma conduta deve ser. Especificamente, estabelecem a ligação deôntica - isto é, através do verbo dever ser- entre determinada previsão factual e atos de coação. Dado o fato p, deve ser o ato de coação q. A estrutura desse enunciado, portanto, possui o antecedente (p) conectado deonticamente ao consequente (q). A formulação kelseniana admite, a partir dessa estrutura básica duas alternativas: ou se estabelece a ligação deôntica entre condutas humanas (atos ou omissões) e sanção, ou entre fatos diversos de condutas humanas e atos coativos diveros de sanção. (.....) Em Kelsen, portanto, a estrutura da norma jurídica, pelo menos segundo a descrição dada pela proposição jurídica, é sempre a de ligação deôntica entre a referência a certo comportamento p e uma sanção q. De modo mais simples, toda norma jurídica pode ser compreendida como imposição de uma sanção à conduta nela considerada" ( Fábio Ulhoa Coelho, Para entender Kelsen, p, 35 e 36)


*Liberdade
_ Kelsen não trata especificamente da liberdade, mas ao cuidar da normatização do comportamento fala que nem tudo interessa ao Estado e tem de ser regrado. Há comportamentos que não tem relevância para o legislador. Esses comportamentos humanos não regrados, que permitem que as pessoas se comportem sem restrições/sanções é dado por Kelsen como o Minímo de Liberdade.


*Fonte de Direito- Kelsen
- Para Kelsen apenas as normas são fontes de direito. Kelsen entende que costumes podem ser utilizados como um auxílio às normas, mas não são normas.

Texto: "A teoria das fontes, em suas origens modernas, reporta-se à tomada de consciência de que o direito não é essencialmente um dado, mas uma construção elaborada no interior da cultura humana. Ela desenvolve-se pois, desde o momento em que a ciência jurídica percebe su objeto (o direito)como um produto cultural e não mais ocmo um dado da natureza ou sagrado. Com isto se cria, porém, um problema teórico, pois o reconhecimento do direito como uma construção não exclui seu aspecto como dado, posto que, afinal, se o direito é feito, é obra humana, a matéria-prima não se confunde como a própria obra.
Esse tipo de reflexão já aparece, por exemplo em Savigny no início do século XIX, o qual procura distinguir entre lei (enquanto um ato do Estado) e seu sentido, isto é, seu espírito, que para ele repousa nas convicções comuns de um povo (.....)
A formulação mais acabada dessa concepção encontramos na pirâmide kelseniana, que vê no ordenamento apenas normas hierarquizadas conforme seu fundamento de validade e postula que o direito só tem uma fonte- o próprio dirieto (tudo refluindo para sua conhecida norma fundamental).
Na verdade, a expressão fonte de direito é uma metáfora cheia de ambiguidades. O uso da palavra está transporto e pretende significar origem gênese.   (Tércio Sampaio Ferraz Junior, Introduçaõ ao estudo do direito, p, 225 e 226)

Texto: Teoria geral do direito e do Estado-  Kelsen  p. 191 e 192




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